Dois CDPs (centros de detenção provisória) da região estão entre os dez mais superlotados do Estado. As unidades de guia da cidade Piracicaba e guia de Hortolândia abrigam população carcerária mais de cem por cento acima das suas capacidades. São 36 unidades dessa categoria espalhadas por todo o Estado. A função desses estabelecimentos é abrigar o detento até que ele seja julgado.
Com exceção dos CDPs de Piracicaba, que está na terceira posição no ranking, e Hortolândia, o décimo da lista, as demais unidades com excesso de população carcerária são da Região Metropolitana de São Paulo. O caso mais grave é o CDP 4 de Pinheiros, que abriga um número de detentos 239% superior à sua capacidade. O estabelecimento tem 1.736 homens, mas foi construído para 512 vagas.
Em Piracicaba a situação não é tão diferente. O CDP também foi construído para comportar 512 detentos, mas abriga atualmente 1.496. A população carcerária do estabelecimento está 192% acima daquela prevista quando a unidade foi construída.
Em Hortolândia, a unidade do complexo penitenciário foi projetada para 768 presos, mas 1.859 homens à espera de julgamento se espremem no estabelecimento, 142% acima.
Apesar de superlotado, no CDP de Americana a situação é um pouco melhor. Mesmo assim, a unidade ainda abriga o dobro de presos em relação à capacidade. São 1.158 detentos que disputam lugar em um local que foi construído para abrigar 576. No CDP de Campinas a lotação é menor. O estabelecimento, construído para 768 homens, abriga 1.430 – 86% acima da sua capacidade.
Nenhum dos 36 CDPs do Estado de São Paulo está com a sua população carcerária dentro do limite. Mas há situações mais “confortáveis”. É o caso da unidade de Franca. Construída para 768 detentos, abriga atualmente 890, número 16% acima da sua capacidade.
Essa é a unidade com o número mais próximo do ideal em todos os CDPs paulistas. No entanto, é preciso considerar que a unidade de Franca é também uma das prisões mais recentes de São Paulo. Foi inaugurada há um ano e cinco meses. O CDP paulista mais superlotado, o de Pinheiros, foi inaugurado em 2008.
No total, existem 24.724 vagas nos CDPs paulistas. Mas o número de presos por eles abrigados é muito superior: 53.472. Na média, os estabelecimentos estão com as suas populações carcerárias 116,2% acima das suas capacidades.
A população de todas as unidades prisionais do Estado de São Paulo foi atualizada no último dia 20 e pode ser consultada no site da SAP (Secretaria Estadual de Administração Penitenciária) – www.sap.sp.gov.br.
Problema Crônico
A situação de superlotação dos CDPs não é diferente das penitenciárias, que abrigam, invariavelmente, população carcerária muito acima das suas capacidades.
No entanto, deve-se destacar que os centros provisórios abrigam aqueles que ainda aguardam julgamento. Eles tanto podem ser condenados como inocentados. Pelas normas internacionais dos direitos humanos, os acusados deveriam ser soltos enquanto o julgamento estiver pendente.
O artigo 9º do Pacto Internacional dos Direitos Civil e Políticos diz: “a prisão preventiva de pessoas que aguardam julgamento não deverá constituir uma regra geral, mas a soltura poderá estar condicionada a garantias que assegurem o comparecimento da pessoa em questão à audiência e a todos os atos do processo, se necessário for, para a execução da sentença”.
Plano de Expansão
A Secretaria de Administração Penitenciária enviou nota à redação do LIBERAL. Segundo a assessoria de imprensa da pasta, está em andamento o plano de expansão de unidades prisionais no Estado. A previsão é construir 49 unidades. O investimento é de R$ 1,5 bilhão de reais.
De acordo com a secretaria, já foram inauguradas cinco unidades.
Os CDPs de Franca e Jundiaí, o Centro de Progressão Penitenciária de São José do Rio Preto e as penitenciárias femininas de Tremembé e Tupi Paulista. A SAP espera que, ao final do plano, sejam geradas mais 39 mil vagas no sistema prisional paulista.
Estão em construção 11 unidades prisionais, entre elas três CDPs: o de Pontal, no Pontal do Paranapanema, o Taiuva e o de Cerqueira Cesar. Outros dois CDPs estão em processo de licitação: o Riolândia e o de Icém. Também estão em construção, segundo a SAP, o Centro de Progressão Penitenciária de Jardinópolis, quatro penitenciárias e três penitenciárias femininas. Há três penitenciárias em licitação.
A secretaria afirma que a distribuição das unidades por todo o Estado obedece ao princípio da regionalização. “A proximidade do preso junto aos familiares também tem grande importância no processo de reintegração social”.
A direção do Sindicato dos Funcionários do Sistema Prisional do Estado de São Paulo foi procurada para comentar a nota enviada pelo governo, mas não retornou a ligação.
‘Ele é uma pessoa’
O advogado criminalista Márcio Pires da Fonseca condena a superlotação dos CDPs. Ele lembra que a Constituição tem como parâmetro a dignidade da pessoa. “O preso não perde a sua dignidade, porque ele não deixa de ser humano. Ele não é uma coisa, ele é uma pessoa”, afirma. “Eles (os presos) se revezam para poder dormir e as condições de higiene são precárias”, diz.
Fonseca lembra que o governo estadual tem investido na construção de novas unidades prisionais, mas ficou provado que o número é insuficiente. Ele explica ainda que a Lei de Execução Penal tem como base a ressocialização do preso, “mas como falar em ressocialização se o aguardar do julgamento preso já é uma violência”, questiona.
Para tentar amenizar o problema, o governo federal editou a lei 12.403 em maio deste ano, com objetivo de propor medidas alternativas para descongestionar o sistema prisional. A avaliação da lei que prevê a possibilidade de o preso por crimes com penas de até quatro anos é bem avaliada pelo advogado. “Tem casos em que o detento aguarda um, dois anos para ser julgado e acaba inocentado, depois de passar dois anos presos”, diz.
Para o advogado, é importante que exista uma medida alternativa à prisão. “Às vezes um garoto de 18 anos comete um delito e vai para o sistema e lá ele encontra marginais acostumados ao cárcere e ele vai sofrer todo tipo de humilhação. É mais uma alma perdida, que não tem condição de ressocializar”.
A lentidão da Justiça contribui decisivamente para a superlotação das penitenciárias. É comum, segundo Fonseca, a primeira audiência acontecer meses depois da prisão, fazendo com que o detento permaneça muito tempo no local que foi construído para abrigá-lo provisoriamente.
Fonte: Jornal O Liberal